Para escapar da crise europeia e das revoluções no mundo árabe, a fabricante gaúcha prioriza, agora, a América Latina.
Por Rafael FREIRE
Por muitos anos, a atuação global vem sendo apresentada como uma espécie de receita segura no caminho do sucesso para as empresas brasileiras. Foi exatamente essa a trilha seguida pela Marcopolo, fabricante de carrocerias de ônibus, baseada em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha. A partir de 1991, com a abertura de uma fábrica em Portugal, a montadora empreendeu um vigoroso processo de abertura de fábricas fora da América Latina. A lista incluiu a Rússia, o Egito, a África do Sul e a Índia. O problema é que a montadora acabou sendo, de certa forma, atropelada pelo bonde, melhor dizendo, ônibus da história.
Pé na estrada: o modelo Paradiso G7 é a principal arma da Marcopolo para o mercado global.
As revoltas no mundo árabe e a crise do euro obrigaram-na a fechar as unidades de Portugal e da Rússia, além de deixar em ritmo lento a filial egípcia. A Marcopolo só não entrou no vermelho porque, ao contrário do mercado externo, internamente vivia uma realidade diversa. “Tivemos a ousadia de manter os investimentos no Brasil em meio à crise de 2008 e com isso preparamos nossa produção para atender à surpreendente demanda no País”, diz José Rubens de La Rosa, CEO da companhia. Hoje, a operação local representa 72% das receitas. Em 2004, respondia pela metade. A opção pelo mercado interno se reflete no balanço financeiro de 2011, divulgado na terça-feira 28: a receita líquida cresceu 13,6% em relação a 2010, para R$ 3,36 milhões, e o lucro foi de R$ 344 milhões.
Os números foram bem recebidos pelos analistas. “A Marcopolo cresceu acima do mercado”, afirma Cristiane Fensterseifer, especialista em transportes da corretora Geração Futuro. Enquanto o setor avançou 9% em 2011, a montadora gaúcha aumentou sua produção em 12,3%. A empresa soube tirar proveito de uma série de fatores conjunturais para acelerar o passo no Brasil. O principal deles foi a manutenção da linha de crédito, no valor de R$ 52,4 bilhões, para aquisição de máquinas e equipamentos no âmbito do BNDES. Além disso, houve ainda uma significativa antecipação de compra por parte dos frotistas para se adaptar à nova lei ambiental que obrigou a adoção de veículos menos poluentes. Ao que parece, a Marcopolo conseguiu estancar as “dores da globalização”.
José Rubens de la Rosa, CEO da marcopolo:
"Ousamos ao manter os investimentos em meio à crise"
Os resultados colhidos agora são frutos de uma guinada estratégica iniciada em 2007, quando foi lançado um plano de investimentos de R$ 700 milhões até 2016. Para este ano, a previsão é desembolsar R$ 140 milhões. Parte dessa quantia será usada para viabilizar a parceria com a concorrente Caio Induscar, na construção de outra fábrica no Brasil. Uma das alternativas é assumir ativos da catarinense Busscar, que está em recuperação judicial há dois anos. Mas isso não significa que a Marcopolo tenha desacelerado seus planos no Exterior. “Os mercados interessantes são aqueles com muita extensão territorial e população de baixa renda”, diz Carlos Zignani, diretor de relações com investidores da Marcopolo.
Segundo ele, para cumprir a meta de crescer 7,5% neste ano, a companhia conta com as operações espalhadas pela América Latina, que representam cerca de 40% do seu faturamento no Exterior, além da contribuição das filiais da Índia e da Austrália. Esta última entrou na rota da Marcopolo em dezembro, com a compra da Volgren. Elas seguirão a nova cartilha da globalização que prevê maior autonomia para as subsidiárias que podem, por exemplo, fabricar peças utilizadas em suas linhas de montagem. “Atuar verticalmente é mais rentável, pois permite mapear onde é mais vantajoso comprar determinados insumos”, afirma Cristiane. Essa política foi adotada depois que a Marcopolo sofreu com a valorização do real e perdeu competitividade em mercados importantes, por concentrar no País a produção de componentes.
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