quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Uma breve história do transporte no Rio de Janeiro , do Papa-Filas ao BRT



Lembro ainda de poucas cenas da minha infância pobre que como muitas, era desprovida de brinquedos já que o único que havia ganho, um ônibus japonês movido a pilhas já havia quebrado alguns anos antes. Com minha mãe presa em uma máquina de costura praticamente o dia inteiro e sem televisão (naquele tempo aparelho de tv "era coisa de rico"), só me restava observar da janela de onde residia, nas imediações da Praça da Bandeira, o ir e vir de ônibus e bondes de um lado para o outro. Eles faziam a ligação entre o Centro (que chamavam na época de "cidade") aos remotos bairros da zona norte e subúrbio.
Os bondes tinham cor verde, dois modelos e diversas configurações de acordo com a linha. Alguns carregavam um carro adicional que era chamado de "reboque" e em outros esse dispositivo não existia. Eram constantes e sem intervalo passando a todo momento nas duas extremidades do final da Avenida Presidente Vargas, que na ocasião terminava na Praça da Bandeira. Nesse local havia um grande mercado municipal e uma garagem que abrigava esses bondes e alguns quarteirões começavam a ser desapropriados e demolidos para a construção dos primeiros viadutos do hoje chamado "Trevo dos Marinheiros".
Curiosamente coloridos os ônibus se dividiam em duas categorias (ônibus e lotações) e passavam com menor frequência na avenida que até hoje é uma das principais de acesso ao centro. Já naquela ocasião em início dos anos 60 essa categoria de transporte mostrava os primeiros sinais de exaustão no serviço e a cidade crescia desordenadamente com a população aumentando consideravelmente. Os maiores polos de emprego eram centro e a zona sul onde para se chegar os passageiros tinham que passar forçosamente pelo centro. Não existiam na época os túneis Santa Barbara e Rebouças que seriam construídos poucos anos após e não haviam ligações como a Linha Amarela, Elevado do Joá, etc.
Que festa eu fazia sozinho na janela e na minha imaginação infantil em meio a isso tudo. Nesse devaneio de criança era inevitável não notar vez ou outra passagem de um tipo de ônibus gigante que minha mãe dizia se chamar "papa-filas". Tratava-se de uma carroceria em formato de ônibus de tamanho gigante que era puxada por uma cabine de caminhão onde o motorista ficava isolado dos passageiros. O que eu não sabia era que os "papa-filas" que eu avistava eram os últimos a circular no Rio, por volta do início dos anos 60 já que essa modalidade de ônibus que nos chegou na metade dos anos 50, não deu certo em nossas ruas. Seu extenso tamanho era o principal fator de dificuldade de fazer este veículo efetuar manobras nas ruas e avenidas da cidade, principalmente no centro.
Na época não se imaginava que estes necessitariam trafegar por vias segregadas ou especiais para um bom rendimento. Até mesmo os bondes circulavam em pistas normais junto aos ônibus, caminhões e demais veículos. O cobrador do "papa-filas" passava um grande sufoco, pois não havia meios de comunicação com o motorista e o veículo transportava cerca de 60 passageiros sentados (e centenas de pé nos horários de rush), além de ainda não existirem as roletas nos ônibus. Essa novidade foi introduzida quando chegaram na cidade os ônibus elétricos que mesmo tendo começado a circular nessa época tiveram carreira curtíssima e o serviço ficou inativo em menos de 10 anos igualmente aos papa-filas.
Pouco depois as roletas foram adotadas nos ônibus movidos a óleo diesel (outra novidade para a época) introduzidos pela Companhia de Transportes Coletivos (CTC), empresa de ônibus do Estado. Em verdade os ônibus elétricos circulavam no centro e zona sul em substituição a linhas de bonde que estavam sendo extintas. As únicas linhas do "elétrico" que funcionavam no subúrbio cobriam o trecho Vieira Fazenda/Cascadura (Vieira Fazenda era uma localidade próxima à entrada da Favela do Jacarezinho, na antiga Avenida Suburbana que hoje chama-se Av.Dom Helder Câmara) e Cascadura/Taquara.
Os papa-filas seriam hoje o equivalente aos ônibus municipais de dois eixos. Estes não mais circulam no Rio mas existem em algumas linhas do Corredor Viário Expresso Tiradentes (em São Paulo). Existem ônibus de dois eixos em nossa cidade apenas para viagens interestaduais. No início dos anos 60 os ônibus coletivos tinham uma extensão menor do que os atuais e transportavam cerca de 36 passageiros sentados (com teoricamente 29 "de pé"). Foram inseridos na maioria das linhas em substituição aos antigos "lotações" (que hoje se equivalem aos micro-ônibus).
Na década de 80 a empresa estadual CTC fez nova experiência introduzindo os primeiros ônibus articulados. Circulavam nas linhas Usina/Praça 15 e Marechal Hermes/Praça 15. Foram adquiridos também pela empresa particular Viação Litoral e circularam experimentalmente na linha Gávea/Cascadura. Essa iniciativa, entretanto também não foi vitoriosa e os articulados tiveram carreira curta igualmente aos "papa-filas" devido às mesmas dificuldades. Os últimos "papa-filas" circularam em torno de 1963. Hoje curiosamente ainda são encontrados em pleno serviço em raros lugares onde o transporte público consegue ser pior que no Brasil, como em Cuba (e por sinal as composições são oriundas daquela época).
Os papa-filas receberam apelido de "minhocão" que depois passou a identificar os ônibus articulados. Nenhuma dessas experiências do transporte foi aplicada na região de Guaratiba ou Campo Grande (nos anos 60 consideradas como "zona rural"). Em Guaratiba morava "pouca gente" que eram bem servidos com um sistema de lotações e bondes oriundos do início do século 20.
Hoje, o que há de mais moderno em funcionamento em linhas cariocas, o ônibus de piso baixo adotado em linhas do centro e zona sul não devem vir para Guaratiba. Os principais entraves são nossas estradas possuírem uma incontável e desnecessária quantidade de quebra-molas que não se sabe se foram instalados pela Prefeitura ou moradores. Esses temem a circulação de veículos em alta velocidade em estradas curvas, estreitas e sem acostamento. Nosso grande e esperado benefício será mesmo o início da operação dos ônibus expressos do Corredor Transoeste, que além de articulados e com ar condicionado, possuem capacidade para transportar 165 passageiros (não é informado quantos assentos possui ou a capacidade de passageiros de pé). Levando-se em conta que um ônibus comum de linha municipal hoje em serviço transporta 52 passageiros sentados e cerca de 150 de pé em horários de rush na Av.das Américas, estima-se que os BRT´s que teoricamente deveriam transportar 165 passageiros venham a ter a carga de 250 por cada composição.


Fonte: Texto: Ronaldo Andrade Inácio  http://www.portalguaratiba.com.br/2012/noticias/240101_uma_breve_historia_do_transporte_no_rio_de_janeiro_do_papa_filas_ao_brt.html

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